Criada como forma de estimular o atingimento dos objetivos estratégicos das empresas na busca de melhores resultados nas vendas, a instituição de metas quantificando o resultado esperado na atuação dos vendedores, dos quais os representantes comerciais se integram, tem sido objeto de profundas discussões quanto a sua legalidade quando utilizada de forma abusiva, contribuindo para o açodamento dos conflitos entre representantes e representados.
Quando utilizada de forma equilibrada, estimula o profissional na busca de resultados, que também o beneficiará, ajudando na aferição e análise mercadológica do potencial de vendas em determinada zona de atuação do representante. Contudo, quando adotada com desequilíbrio, extrapolando a razoabilidade, ou seja, estipulando objetivos quantitativos exagerados, além da capacidade de negócios em determinada região geográfica, torna-se abusiva e prejudica o bom relacionamento com a equipe de vendas, criando constantes animosidades e desgaste na relação comercial que poderia ser evitada se a meta fosse estipulada de comum acordo, aproveitando, nesse aspecto, o conhecimento e expertise do representante comercial.
Vale lembrar, com efeito, que o representante comercial raramente presta serviços exclusivos para uma empresa representada, possuindo em sua carteira de clientes diversas empresas para as quais deve cumprir seu mister de mediar negócios mercantis e extrair pedidos de compras. Nesse sentido, previu o art. 41 da Lei 4886/65 que “Ressalvada expressa vedação contratual, o representante comercial poderá exercer sua atividade para mais de uma empresa e empregá-la em outros mistéres ou ramos de negócios.”
Lado outro, goza o representante comercial de liberdade para adotar a sua estratégia comercial, bem como assumir determinadas obrigações em suas relações com as representadas, dentre elas o acatamento de metas para cumprir, servindo, não raras vezes de justificativa para rescisão contratual por algumas empresas quando determinado objetivo não for alcançado, invocando, para isso, a alínea a ou c do art. 35 da Lei de Regência, que elenca os motivos justos que para o representado denunciar o contrato de representação.
Todavia, sendo por desídia (alínea a) ou por descumprimento de obrigações (alínea c), há que se ter a devida ponderação à luz da necessária e indispensável razoabilidade na aplicação dos referidos preceitos, mormente quando se põe em relevo os princípios da função social dos contratos e da boa-fé, insculpidos respectivamente nos artigos 421 e 422 do Código Civil.
Nessa linha, utilizar como motivo justo para rescisão do contrato de representação o descumprimento de metas previamente exacerbada e fora da capacidade potencial da zona de atuação do representante, escancara uma atitude que viola não apenas os princípios retromencionados, mas, constitui-se em ato ilícito, na forma como instituído pelo art. 187 do mesmo diploma civil.
O descumprimento de metas a substanciar a alegada desídia pelo representado, também dever ser vista com muita cautela, haja vista o interesse muitas vezes oportunista de empresas que utilizam como estratégia de afastamento de determinado representante comercial a simples queda nas vendas, fato que per si não implica em descumprimento contratual, devendo ser comprovado o nexo causal entre a conduta do representante (ou a sua omissão) e a redução das vendas, haja vista que determinadas condições mercadológicas também contribuem para afetar os negócios em determinada região, ou no próprio País, como recentemente ocorreu na pandemia.
Em sentido diverso, contudo, não se pode excluir do rol de obrigações do representante o cumprimento de metas previamente assumidos por ele no contrato de representação, mormente quando tais objetivos de vendas se derem de forma razoável, equânime em relação a toda a equipe de vendas, sendo, portanto, motivo justo quando ocorrer reiteradamente, mesmo após a advertência pela empresa representada.